Oi pessoal, tudo bem?
Sim, eu desapareci daqui e da maioria das redes, fevereiro saiu distribuindo um monte de dias e tarefas e quando vi chegava em 20 dias e não tinha escrito uma mísera cartinha. Mas calma que foi por bons motivos.
O principal deles foi que estava finalizando a escrita e a organização de um novo livro: Por que estudar fãs na Comunicação? conjuntamente com Eloy Vieira e Aianne Amado. Apesar de tecnicamente ser uma coletânea, na verdade, é um livro escrito por nós 3 em colaboração e em diálogo com outras colegas: Giovana Carlos, Sarah Moralejo, Clarice Greco, Thiago Soares e Simone Pereira de Sá.
Eu diria que o livro está num entre-lugar entre o autoral e uma coletânea. Eu, Eloy e Aianne desenhamos a estrutura do livro. De posse dessa estrutura convidamos duplas de colegas - que nós selecionamos ditatorialmente rs - para escreverem sobre os temas solicitados. Para completar nós 3, além de ter participado como co-autores nos capítulos, editar os textos, ainda escrevemos uma Introdução e um Capítulo Final, estabelecendo o link entre tudo. Esse livro tenta sistematizar e sintetizar, como foco na graduação - esse era o briefing do edital - os 20 e poucos anos de Estudos de Fãs no país. Além disso, temos uma apresentação incrível da colega Raquel Recuero.
Discutimos história, trajetória(s) do campo, métodos, temáticas consolidadas e perspectivas futuras. Nossa ideia era um livro que compilasse o que estava espalhado em teses, dissertações e artigos para qualquer pessoa que se interesse pelo tema e queira por exemplo fazer um TCC nesta área (ou um projeto de Mestrado) possa ler e sair com um intensivão resolvido sobre por onde começar e quais as principais fontes. No momento, o livro está na fase de revisão antes de ir para a editora. Estou super orgulhosa do resultado porque tocamos isso coletivamente a partir de uma demanda do Laboratório de Pesquisa e porque todos nós, apesar das 1001 conturbações e dificuldades, não deixamos a peteca cair e finalizamos tudo dentro do prazo e com algo que realmente vai contribuir para um objetivo muito legal, sobretudo pra pesquisa na graduação.
Muitas dicas, pouca prática
O que vim tratar aqui hoje não é do livro em si - deixo isso para uma outra oportunidade, a do lançamento - mas sim, do grande bicho de sete cabeças no qual muita gente - principalmente acadêmicos - tem transformado a escrita e a vida acadêmica. Acompanho alguns conteúdos sobre o tema nas plataformas e confesso que há dicas demais, a maioria delas vindas de pessoas que encontraram uma fórmula e já querem sair ensinando a tal fórmula.
Eu sou cética em relação a tais fórmulas até porque a maioria delas leva em conta um imaginário sobre o que seria o formato acadêmico em si, desconsiderando que há diferentes tipos e estilos de escrita. Eles variam não apenas em relação às diversas áreas do conhecimento, mas também em relação a revistas, livros, editoras, objetivos, etc. Prefiro pensar em práticas de escrita que derivam de questões.
O primeiro ponto é qual o objetivo deste artigo/livro? Qual seu público-alvo? (É um texto mais duro, mais voltado aos pares ou é algo mais na linha divulgação científica?) Eu quero fazer algo mais teórico, mais ensaístico, ou é um texto de revisão e discussão de literatura? É um texto empírico com análise? É um artigo focado em destacar a teoria? Ou é um artigo mais sobre os dados? É um relato de experiência? Vai ser escrito em primeira ou terceira pessoa? É um texto de uma disciplina - textos de disciplina tem funções pedagógicas muito mais voltadas ao processo da aprendizagem em si do que um texto que vai ser publicado numa revista por exemplo - e eu quero submeter a um congresso ou a um periódico?
O segundo ponto é onde, em qual veículo (revistas/periódicos) esse artigo poderia vir a ser publicado? Que estilos de artigos já foram publicados nessa revista? O texto vai ser submetido a uma sessão de temas livres ou vai para uma edição especial/dossiê?
Minha recomendação é sempre ler os anais do evento e ler o Sobre a revista, além dos editoriais, apresentações e os próprios artigos para entender o tom e o tipo de temática e de abordagem. Parece óbvio né? Mas vejo que muitas pessoas não fazem isso e saem alucinadamente tentando publicar e sofrendo duplamente (ao escrever e ao tentar e não conseguir).
Uma outra prática que me ajudou muito lá nos idos de 1996 e que fez com que eu tivesse a constância na escrita foi ter participado da hoje clássica Oficina Literária do Assis Brasil. Fazer oficina literária foi uma das melhores coisas que fiz pelo meu texto acadêmico. Uma outra hora volto nisso.
Sem levar essas questões em consideração, fica muito difícil ter um mínimo de prazer e mesmo de acerto ou objetividade. Aí realmente como se lê por aí tudo vira choro, mal estar da escrita e outros dramas que dão uma falsa sensação de acolhimento, mas na real me parecem mascarar o cerne do problema: por que você decidiu fazer algo que você não gosta e/ou não sente afinidade? Você é masoquista? Você gosta de sofrer e sentir culpa? Eu não. Não sou cristã, não creio em culpa desde o nascimento e tão pouco creio que se precise sofrer demasiadamente para obter resultados e para viver. Pelo contrário, eu acredito muito em tentar equilibrar os pratinhos.
Quando eu leio esses conteúdos sempre saio com a sensação de que as pessoas curtem uma narrativa do sofrimento, e com isso, não digo que não seja difícil. Gostar de algo, não o torna necessariamente mais fácil. Mas a prática e a repetição facilitam sim. Vale para a escrita - acadêmica ou não - o que vale para exercícios físicos: constância, treino, repetição, organização.
Acho que minha idade avançada tem me feito ficar um tanto alérgica e intolerante a tanta reclamação que é derivada de escolhas das próprias pessoas. Isso quer dizer que as coisas não precisam ser problematizadas e não podem mudar? Não, longe disso, mas a mera reclamação sem uma mobilização para a mudança só gera ainda mais desgaste e de certa forma ajuda a narrativa de “ninguém precisa ir pra universidade, vamos todos ser empreendedores” ou “ciências humanas para quê”. E a gente sabe muito bem de onde e de quem partem esses chavões.
E não, eu não acredito que a Academia salve o mundo. Muito, muito longe disso. Os vieses e os resultados nada neutros do cientificismo exacerbado estão aí na nossa cara. Porém, ainda acho que temos contribuições a dar, ainda acredito na comunidade, que como toda e qualquer comunidade vai ter hierarquias, relações de poder e confusões. Pessoas, pessoando, como diz minha amiga Dora.
O drama dos (gaúchos) na Academia rs
E por fim, eu sou extremamente prática, me divirto fazendo o que gosto e pago as contas dessa forma, consegui muita coisa legal a partir desse caminho e acho que des-romantizar da Academia, retirar esse caráter “wow fulaninho figurão” para algo mais ok é um trabalho muito legal, mas é um trabalho e para tanto existem metas e tarefas a serem feitas, como em qualquer outra rotina laboral. Isso não quer dizer que a docência e a pesquisa não tenham suas especificidades e seus próprios tempos, que são distintos de outros tipos de trabalho. Mas ai a auto-análise é o melhor caminho para compreender o que te mobiliza ou não e de que forma é possível organizar isso com o menor sofrimento possível.
Eu sei, é um tanto duro falar dessa forma direta e reta (eu sou gaúcha e portanto quase no limite de isso soar como grosseria e tosquice enquanto ethos), ainda mais para determinadas gerações que acham que terão gratificações instantâneas feito ganhar chuva de likes ou um comentário de “Arrasou, ta linda”. E ainda mais num contexto acadêmico onde temos avaliações constantes - revisão por pares, entre outros - e toda a problemática dela derivada.
Mas o fato é que se você deliberadamente escolheu se matricular num curso stricto sensu ( a menos que alguém tenha colocado um revólver na sua cabeça e o obrigado a ir pra Academia), muitas vezes o melhor é respirar, sentar e começar. Escrever uma ou 2 linhas por dia é melhor que nada. Se está com problemas de saúde mental, procure ajuda com profissionais da área. Por mais que você troque ideias, seu orientador não é seu analista e nem tem essa obrigação. Ele ou ela deve ouvir e discutir sobre o seu trabalho.
Tente cumprir os prazos, e quando achar que não consegue converse, peça ampliação, explique, mas não suma. Dar ghosting em parceria de trabalho não é um bom caminho, pois não é um match mal sucedido em aplicativo de pegação, é feio, deselegante e pode te gerar problemas depois, pois o circuito é pequeno. Cultive amigos e parcerias de trabalho. Eles vão te salvar.
Eu tenho achado que muitos problemas desse tipo são da ordem da (n)etiqueta. Eu sei, parece algo antigo ou totalmente demodê, mas tenho observado que o problema em torno da falta de noções sobre relações sociais nesse ambiente tem muito dessa chave de uma falta de regras claras sobre os comportamentos, com muita gente sofrendo desnecessariamente e outros tantos se apropriando disso.
Tô no mood total Dark Academia
Comecei essa cartinha de um jeito e terminei de outro, num quase desabafo . O calor do fim dos tempos não está facilitando muito o raciocínio complexo (me sentindo o Pink de Pink & O Cérebro).
Links e recomendações:
"algorithmic gaze". would Walter Benjamin like memes? - é um longo ensaio do incrível substack How to do things with memes de Aidan Walker. Como pensar no olhar (gaze) a partir de Walter Benjamin (cinematic gaze) e de Laura Mulvey (male gaze) para discutir o “algorithmic gaze” nos memes do TikTok.
Beleza Fatal - Novelão do escritor Raphael Montes na HBO Max que mistura Nip e Tuck, Aveninda Brasil e Revenge num produto híbrido entre a novela e seriado. Tenho me divertido horrores com o elenco e com a vilã over Lola (Camila Pitanga) que faz muita referência as influenciadoras, recebidos, e todo esse universo.
“Changing the game but keeping to the rules: Ambivalences between social activism and content creation in the Brazilian sports scene”, artigo da Beatriz Blanco, publicado na revista Eludamos (específica da área de games), sobre as ambivalências entre ativismo e criação de conteúdo produzido por minorias no mercado de games e e-sports no Brasil. Resultados preliminares da tese da Bia (que vem ai!) sobre streamers mulheres.
Chamada da Aoir2025 no Brasil - #AoIR2025 Call for Proposals |- prazo de envio de resumos até dia 01/03. O evento vai rolar na UFF em Niterói entre 15 e 18 de Outubro de 2025.
Babel ou A necessidade de Violência de RF Kuang traduzida para o português por Marina Vargas, ed Intrínseca, 2024. Ainda não cheguei ao final, mas tô impactada demais por essa obra que eu chamaria de fantasia Dark Academia (nada pode ser mais a minha cara do que darkacademiacore) sobre tradução.
Aliás, só depois fui ler o relato da tradutora e achei muito massa.
Até a próxima!
Esse gênero fantasia dark academia me ganhou.